terça-feira, 29 de julho de 2008

Bela, porém coxa


"Brás visita Dona Eusébia e conhece sua filha, Eugênia, a quem chama de "flor da moita", por tratar-se de filha ilegítima de Eusébia e Vilaça. Brás enamora-se com Eugenia e a beija, mas sabe que não deve se envolver demais com ela, por tratar ela de classe inferior a ele (preconceito da época) e também por ser ela portadora de um defeito de nascença (ser ela manca). Ele vivia repetindo: bela, porém coxa."
Memórias Póstumas de Brás Cubas - Machado de Assis

***
Essa é Sharon, minha "flor da moita" tunisiana, que é toda pintosa, mas esconde um terrível problema de marcha. Se não tem tu, vai tu mesmo.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Aqui jaz

Percalços: descalço, silencioso e anacrônico

Pubblicità, bello!

Amicci, ainda não tinha visto publicidade italiana decente até a semana passada, até porque vi pouquíssima tevê desde que cheguei. Vale relatar que a nossa programação tem qualidade de BBC perto da daqui, incluo claro Super Pop e Bom Dia & Cia com aquela menininha que parece enviada do Demo. Não que esses Mica Cards sejam o elixir da criação, mas para quem estava há quase 3 meses sem se alimentar de coisa boa propagandisitcamente, deu pra engolir redondo.


Mini é foda. Tem muito no Norte da Itália e a plebe daqui do Sul ainda tá aplicando no colchão para comprar uns, mas sabe que é bacana. O conceito é simples: um canudinho e papeizinhos para brincar de zarabatana e espantar o tédio. Tudo a ver com la macchina.


Esse de Philadelphia Light é o mais fraquinho, mas vale pela mídia que abre e fecha. O cara tá de camisa e se você tirar ele fica assim, com essa barriga de tanquinho. Target é mulher, na certa, mas pega uma boa parte das bibas e metrossexuais que gostam de comentar esses atributos e que acreditam que o tal queijinho pode deixá-los assim.


Peça do WWF com cara de shortlist em Cannes e criação brasileira. O título diz: “15 km2 de floresta desaparecem por minuto” e o marido da Jane num momento pré-video-cassetada ninguém precisa explicar, né?


O produto é o mesmo que tem aí no Brasa: depilador Veet. O título: “Quando quero seduzir um macho, me enrijeço, o olho firme nos olhos e boto a língua pra fora – Lucia, macaca africana”. Curti a ironia e o bom humor, afinal, cartão postal na balada já é uma mídia mico, então tem que apelar prum texto micagem pra fazer rir e comentar com a amiga do lado.


Pras agendas Gazzenda. Menina diz: “estarei sempre ao seu lado”. Menino responde: “isso é uma ameaça?”. Pronto, é só isso a piada, mas achei boa. Por sinal, foi dessa marca o único filme que me fez rir na tevê. Os três porquinhos chegavam em casa e sentavam à mesa, o papai porco aparecia com uma frigideira para servi-los. Mas, de repente, tirava uma máscara e era o lobo mau, que gritava: BACOOOON! Pronto, é só isso a piada, mas achei boa.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

O caça-teto - parte 2


...
E veio abrir a porta uma senhora elegante. Com aparência de membro da sociedade paulista de bridge. Era dona e se chamava Silvia. Na sequencia veio uma figura bizarresca, com rabo de cavalo e regata decotada. Era homem, meio ex-drag queen, no Brasil seria carnavalesssssco. Umberto di Baviera, gente fina, educado. Um buldogue francês me lambia a canela. O lugar parecia a casa da familia Adams. Fui subindo as escadas, me mostraram meu possivel quarto. 200€/mes. Banheiro ok, cozinha ok e um terraço fantastico com ducha fria. E uma vista do mar linda do meu quarto. Queria mais o que?

O nome é hoje o próprio contraste. Albergo Moderno. Sim, devia ser moderno em 1920, devia ser suntuoso em seu estilo Liberty e suuuuuper charmoso, como algumas estátuas e detalhes esculpidos na escada entregam.

Os quartos são velhíssimos e empoeirados. Tem um cheiro de mofo que pode incomodar o mais sensíveis, mas minha rinite amiga não me deixa sentir tanto. Calma, eu não moro num cortiço da Cracolândia!
É um lugar com uma energia bacana, que eu senti de cara. Não tem vibe ruim e nem fantasma. Confesso que eu até queria ouvir uns barulhos estranhos, vozes ou ver vultos pra poder contar pra todo mundo que eu morei numa casa mal-assombrada, mas a real é que só existem os ruídos normais para uma casa com a idade que tem.

Escala arriba..

Gatos na porta do quarto

Contei 56 degraus da sala até o meu quarto e talvez essa seja a pior parte. Como a cozinha fica no andar de baixo e o terraço um piso acima, meus pés estão sempre limpando o mármore branco da escada. E pra completar minha havaiana esquerda soltou a tira e o remendo se solta a cada 30 ou 40 passos. Boring. Tô esperando chegar a minha velha num pacote que a minha véia mandou há mais de mês, junto com ingredientes para fazer muqueca para Laura e Ermanno.

Nossa, mini-cucina

Estação de trem, uma das vistas da casa. Tem gente que mora no andar de cima!
E no andar de baixo tem uma passagem pra praia.
É uma viagem ver a galera entrando na estação de sunga e guarda-sol


Embaixo tem dois salões enormes e uma cozinha industrial super bacana com uma geladeira dos primórdios. Confesso que ainda não explorei todos os cantos, não só por falta de tempo, mas porque tenho um medinho sim... O lugar onde tem o tanque e o varal é assaz sinistro, pois bate pouca luz e não tem lâmpada. Se esquecer a roupa secando lá, fica fedendo a mofo.

Mas meu quarto é uma delícia. Pé direito altíssimo, deve ter uns 4,5m, cama razoável, armário suficiente, uma pia (muito útil, pra escovar os dentes sem dar um rolê à noite), 2 espelhos, um ventilador que eu montei, duas cadeiras, um tapete sujao, alguns pôsteres com pinturas de flores numa das paredes. E o melhor e o mais impagável, ou o que talvez valha cada centavo do aluguel de 200€: uma vista sensacional do Mediterrâneo.

Aham, sou organizado

Se eu falar, ninguém acredita

Nunca fui de curtir chegar de manhã em casa. Mas trabalhando de madrugada e abrindo a porta do Moderno sempre entre 5 e 6 da matina comecei a curtir o sol entrando pelas frestas e o maravilhoso amanhecer na baía. E percebi que eu sou um cara que dorme fácil, então não tem problema se é dia ou noite, basta estar cansado que Morfeu vem.

Perdoe a qualidade da foto, mas acredite que tava inesquecível

Dia desses a minha surpresa foi quando, da cozinha, vi um ponto amarelo fortisismo no céu, se levantar por de trás de uma da torrinhas da estação. Fechei a porta da geladeira e desacreditei na Lua cheia. Alguns minutos depois subi pro quarto e o que vi ali foi de tirar o fôlego (até tentei a foto abaixo, mas vocês sabem como é difícil fotografar em velocidade baixa sem tripé. Que loucura essa lua e eu não podia ficar olhando, tinha que ir trabalhar! Mas aprendi que nasce na frente do quarto. Vou anotar a próxima e me organizar para fazer umas fotos mais decentes.

Ah, não estou sozinho no Moderno, mas também não tem uma galera. No andar debaixo, na frente da cozinha está Domenico, um senhor baixinho, de uns 50 anos, cozinheiro de um restaurante em Taormina. Ele tem alguma debilidade, é um pouco lento, repete muito as coisas que fala e tem uma organização um pouco obsessiva. Mas é gente fina, acho que vai com a minha cara e sempre temos conversado e subido juntos.

O outro habitante, mais irregular é Umberto, o carnavalesco. Ele trabalha ou trabalhou com teatro a vida toda. É cenógrafo e ajeitou meu quarto em dois dias. A bicha trabalha, vai lá e resolve. O dele é bem divertido, uma coisa meio kitsch, que eu tenho certeza que faria sucesso alugando pra gringos. O cara é gay amaréééééélo, tem um penoir roxo e o buldogue francês que lambe canelas, chamado Oliver. É super gente fina e sempre trocamos altas idéias sobre amenidades. O cachorro é muito feio e eu rolo de rir brincando com ele, realmente me distrai muito. Fotos das figuras mais pra frente.

Tecnicamente eu moro em Giardini Naxos, pois Taormina é só o que está em cima da montanha, mas cá entre nós, eu prefiro estar a 300m do mar do que a vários quilômetros.

Chega mais!

Mas nenhuma parte da casa é tão querida pra mim quanto o terração enorme com ducha fria. Só tem sombra lá depois das 17h30 e sem protetor solar num dá pra encarar não. Dava pra fazer uma senhora festa, aliás você está convidado.

Para chegar? É só descer na estação de trem Taormina/Giardini e dar um berro. Vou abrir amarradão!

segunda-feira, 21 de julho de 2008

O caça-teto

Não sou inteligente, nem bonito, muito menos atlético e forte. Eu sou rabudo. Sim, como diz minha mãe, nasci com o rabo virado pra Lua. E te provo isso: achei um lugar na Eruopa em que me sinto super à vontade, uma família aqui, trabalho num lugar legal e numa dose boa pra num morrer, achei amigos e gente de confiança. Não precisava de mais nada.

Mas como o trabalho era em Taormina, balneário turístico e de bacanas, há uma hora de Catania, não tava mais dando pra ir e voltar todo dia. Pra ajudar o trampo é das 21hs às 4hs ou mais, dependendo do movimento. E numa coincidência (ou não) trabalho num restaurante que vira balada à noite, chamado Casanova. Eu precisava de uma concha. E é exatamente sobre isso que esse post fala: o meu cafofo novo.

Menino fazendo exatamente a mesma coisa que eu: arriscando.
Ele uma pedra com um cachorro nervoso e eu um teto, com tudo conspirando contra


Os preços das coisas em Taormina são altíssimos, assim como a cidade, que fica em cima de uma pedra há 350m do nível do mar, e os custos de alojamento não poderiam ser diferentes. 400€ por mês pra começar a sorrir, num quartinho dos fundo, muquifoso. O que a galera faz? Vai morar em Giardini Naxos, balneário vizinho e mais em conta.

Giardini aqui embaixo, Taormina lá no alto do morro, capicce?

Selva de telas

Gérard Depardieu tem um antiquário na Sicília, sabia?

Tirei um dia e comecei a perguntar de casa em casa em Giardini se não sabiam de alguém que alugava um quarto... andei uns 10km, quem sabe até mais, naquela tarde. Conheci gente muito bacana e que tentou me ajudar muito, como o Sandro, antiquário mafiosão e sósia do Gerard Depardieu. Ou ainda a dona Concettina, do mercadinho, que me mandou procurar a Dona Carlota, que disse que não alugava mais quartos e mandou procurar o senhor Giardina rio acima. Subindo o rio dou de cara com um rebanho de cabras, rio.

Salvatore, o dog e o sorriso. Eita papo bom

Signore Giardina dando uma limpada no quintal

Poxa, tamo do lado do mar, nunca imaginei cabras ao mar. Vejo dois cães brancos lindos, da raça Marimano (???) e um simpático pastor com um lenço vermelho na cabeça. Se chamava Salvatore, começamos a conversar, fiquei encantado com a figura. Deu um berro e chamou Giardina, um senhor com belos olhos claros e falar lento, mas muito atencioso. Disse que talvez em uns 8 dias me conseguisse algo, anotei o telefone. Mais papo.

Será?

Estava completamente desacreditado quando cheguei na frente da estação de trem de Taormina/Giardini. Parei olhei ao redor e vi um grupo de taxistas, me aproximei, achei o mais falante e indaguei sobre o leito/teto/qualquer-coisa-tio!. Não sabiam de nada, previsível, já que taxista aqui é uma raça meio morta e não tem metade do carisma e importância social do que no Brasil. Olhei do outro lado da rua e vi um prédio velho, bonitão, mas caindo aos pedaços, escrito “albergo” (que nada mais é do que hotel, em italiano). À primeira vista parecia desabitado, mas olhando melhor percebi um quarto com uns panos pendurados no teto. Fiquei uns 10 minutos parado ali na frente balbuciando um movimento.

Pensei a lógica dos adesivos dos mano da ZL e do mano Passoka: “Nasci pelado, careca e banguela, o que vier é lucro.”
Respirei fundo.Toquei a campainha.

(mais detalhes nos próximos posts...)

Por que a Sicília?

Famiglia reunida, niver da Laura, me sinto em casa.
Marco, Maria Pia, eu, Sebastiano, Laura, Jessica e Ermanno

Quando eu falo com alguns amigos no MSN a primeira pergunta que vem depois de “como você tá?” é “e aí, por onde andas?”. É engraçado a decepção de alguns quando eu falo que estou na Itália, ainda na Sicília. “Poxa, mas não era uma volta ao mundo?”
Era. Ou é ainda... Só sei que em setembro o barco anda.

Eu viajei (nas idéias) no começo quando achei que ia ter grana pra isso e mais ainda que conseguiria fazer grana em 2 ou 3 meses trabalhando aqui na Europa. Mas a dura verdade é que sem passaporte você não vai ganhar o suficiente para fazer grana em tão pouco tempo, e essa lição foi aprendida. O mundo é muito mais caro do que eu imaginava, principalmente il Vechio Continente. Se ficar no zero a zero já tá lindo.

Mas então, porque fiquei na Sicília?
A resposta começa no dia 27/05, quando cheguei na casa de Laura Le Metre e Ermanno Spampinato, que conheci via couchsurfing. O plano era ficar uma semana com eles e depois me virar. Mas não foi bem assim que aconteceu. E por que? Porque recebi um carinho que nunca imaginei, fui adotado como um filho, assim como Sebastiano, 20, e Jéssica, 16. E o mais louco é que eu acho que eles dois também perceberam isso. Quando falam comigo ou perguntam alguma coisa sobre os pais, eles não falam “onde está ‘minha’ mãe?”, mas “onde está ‘a’ mãe?”. O adjetivo possessivo não existe e esse simples detalhe me faz sentir irmão deles.

Papai Ermanno, numa foto na primeira semana. Nem parece que tem 55 anos

O que me fez ficar aqui foi o carinho incondicional e a força para ajeitar tudo que sempre recebi. Acho que no total, a semana de hospedagem já virou mais de 30 dias. Eu achei um lugar no centro para morar, aquele que tinha banheiro de baldinho, mas continuava indo pra casa deles uma noite por semana, quando tinha folga no Taarna Irish Pub (o pub 171...). Depois arranjei a casa em Taormina e nessa minha primeira semana aqui já passei mais dias lá do que aqui.

Sim, foi uma exceção, já que uma obturação caiu do meu dente molar durante o trampo, na noite de domingo, como já escrevi na coluna “Roubada”, ao lado. Eles foram anjos nesses dias. Ermanno correu atrás de saber nos hospitais públicos como eu poderia refazer os pedaços que se desprenderam. Uma intervenção desse tipo custa por volta de 200€ num dentista particular. Ligou, falou grosso até achar um setor de atendimento a estrangeiros no Hospital Vittorio Emanuelle. Lá, a signora Di Benedetto (sobrenome homônimo ao de um personagem mafioso do livro que estou lendo) foi quebrando galho atrás de galho e marcou uma consulta.

Ermanno e Jessica, espontaneidade

Tentei ativar o seguro de viagem ISIS, mas tomei a maior canseira ligando pra Dinamarca algumas vezes, mandando fax e tudo mais... Tudo isso pra eles me negarem o pedido, sacanagem. Mas daí ativei minha agente de viagens no Brasil, a Zizi, que foi quem me vendeu o seguro. Ela mandou ver nas chamadas e hoje, depois que eu já tinha sido atendido pelo simpático e bem-humorado Dr.Roberto Scuderi, me disse que ia liberar 250$ para o hospital cobrar. Que bela notícia.

E tudo isso começou graças ao empenho e boníssima vontade de Ermanno e Laura. Bicho, é muito coração e muito amor ao próximo, numa potência que eu talvez não conhecesse antes. São mãe e pai nesse lugar pra mim.

Nonna Maria Pia, sempre veloz e frenética

Barriga de chopp, com muito orgulho e muito amôooor

Cozinha típica siciliana

Fui me sentindo em casa, aprendendo a cozinhar com Laura e a nonna Maria Pia, aprendendo (e curtindo) uma língua que eu sempre reneguei, mesmo sendo a língua mãe do meu avô e ficando muito tempo sem falar português. Assumi tarefas do lar, despertando uma paixão pela vira-lata Luna, me esticando para ver a erupção do Etna pela janelinha do sótão. Bater papos sem pé nem cabeça com o Marco, irmão super carinhoso da Laura. Fui me aproximando de Sebastiano, cujo quarto invadi por tanto tempo, e o tímido moleque já sai pra tomar uma breja comigo e me conta dos dissabores com a gatinha da vez. Apesar de já namorar (e ter sido flagrada por mim com a boca na botija do namorado), Jéssica ainda é uma criança e briga por tudo, com gritos e chiliques. Tem algum problema de dicção, pois eu não entendo um A do que ela fala, às vezes dou uma zoada e peço pra repetir.

Parece que estou vivendo algo que estava escrito, sabe?

Ah, como eu me senti à vontade nessa casa, nessa terra, com o Etna vigiando a todos. É uma energia meio maluca e dia desses veio a informação do meu pai: fui concebido aqui, em 1983. Talvez isso explique alguma coisa.

PS: claro que eu tenho mãe, pai, irmãos e avós no Brasil e no coração, isso aqui é só um devaneio. Sem ciúme, por favor. ;o)

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Catânia, uma casa minha

Em um mês você viveu o lugar, sentiu o amanhecer, o entardecer, o trânsito, o silêncio, o cheiro de peixe, a eterna insatisfação das pessoas, o modo de levar mafioso, os humores do Etna, o calor insuportável das 17hs, os velhinhos na frente da igreja lendo jornal, o incompreensível elefante símbolo da cidade, as andorinhas cantando e começando o dia, o feirante te dando um maço de manjericão no final da feira, o sangue do atum pintando o chão da pescheria, os imigrantes asiáticos que, como você, vieram atrás de alguma coisa, espalhados pela praça, esperou mais de hora e meia um busão, tomou cerveja fresca, comeu carne de cavalo, descobriu que ninguém na cidade é mais mafioso do que os quitandeiros e açougueiros da Via Plebiscito, que as meninas catanese se fazem de difícil, mas é mó caô, andou na garupa de uma Vespa à siciliana, ou seja, sem capacete, comprou bilhete de ônibus na tabacaria, correu do controlador, mesmo tendo um bilhete no bolso, tomou seltz a limone pra descobrir que é melhor tomar com xarope de tangerina verde, pegou mais carona do que num ano em São Paulo, comeu mais pizza e macarrão que na vida toda de domingos paulistanos, descobriu que o melhor sorvete do mundo não é de chocolate, mas de limoncello, foi convidado para jantar em varias casas, contou sua história para uma montanha de gente e não cansou ainda.

Fotografou, mas não comprou nem um suvenir da cidade.

Quase um mês.

Uma andorinha só...

Prédio da direita, último andar, 3a janela da esq. pra direita... achou!

Trabalhei num lugar com uma placa de "Passa-se o ponto" e só me liguei no último dia

Siesta delícia nesses bancos da prefeitura

Ah, a montanha...

Um teatro romano no meio da cidade, tá bom pra você?

Prefeitura, local de soneca

Símbolo da cidade, mascote do time. O por quê eu não sei.

Haja suvenir com a cara de Mr.Brando

No sinto, no parlo, no vedo - lema da mafia

Chegar de manhã e o sol lembrar que já é de manhã

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Etna Mega Store

O cume fumando e mais outras crateras em erupção, que não dá pra ver

Aquele mito de que vulcão é uma montanha com um buraco em cima de onde saem jatos de lava periodicamente acabou para mim no dia em que subi no Etna. É a o passeio mais manjado aqui de Catânia, 110% dos turistas vão. Trata-se de uma montanha com 168km de circunferência e cerca de 200 crateras, sendo umas 15 ativas. Para ver tudo isso tem um ônibus que sai diariamente às 08h15 da estação central e custa 5,40, e leva até Rifugio Sapienza, de onde se pega um teleférico (27euros doem). Lá em cima tem mais umas duas horas de caminhada numa estrada até a Torre Del Filosofo ou se pega um busao 4x4 por mais um punhado de cash.

No meio da estrada uma casinha, que foi pro saco na erupção de 2001.
Parece aquelas de pedra, de Caxambu.
Repare no verde que brota em cima da lava das erupções antigas.
Compare com a paisagem abaixo. Parece a mesma montanha?

Marte?

Um mapinha é sempre bom; clique para ampliar

Conheci um grupo de estudantes que está fazendo intercâmbio de universidade com o programa Erasmus, gente da Finlândia, Holanda, Grécia, Turquia e Espanha. E foi com eles que encarei a caminhada e depois, graças à maravilhosa idéia do Davide, o espanhol da turma, pegamos um atalho. A maior roubada da vida, perrengue mesmo. Era uma pedreira de uns 300m de altura, super íngreme e com muita pedra rolando. Não dava para seguir a trilha de quem ia na frente, sob o risco de tomar uma rolling stone na testa.

Fridsa e Perita; ventania, derrubou e arranhou meu óculos

Finlândia posando pra Espanha: esse Erasmus é uma suruba estudantil

Escorregava muito e para andar um metro demorava uma eternidade. Moral da historia, depois de uma hora de pedreira chegamos na Torre del Filosofo, segunda cratera mais alta da montanha, já que a central não está aberta a visitação desde 1990, quando um pessoal se matou lá. Completamente estafado curtimos aquela paisagem marciana, acima das nuvens. Respirei um dos melhores ares da minha vida e poucas vezes passava um futum de enxofre. No dia anterior fui com Ermanno, meu “pai” daqui, levar o carro no mecânico de noite e ele mostrou um monte de pontinhos laranja incandescente na montanha. Era uma erupção que tinha começado faziam uns cinco dias. Fiquei adrenalizado, mesmo estando a uns 20km dali.

Visu de uma cratera inativa, tem uns 70m de profundidade

E depois de 15 dias, arranjei um apê que tem um terraço com vista para a montanha, o que me torna um privilegiado, pois além de desfrutar do sempre belo visual, posso ir aprendendo os humores da montanha. Uns 3 dias antes de eu mudar, uma cratera na parte mais baixa entrou em erupção. Da janelinha do sótão da casa da Laura e do Ermanno eu tinha uma bela visão porque a casa deles é na parte mais alta da cidade, mas ficava com o pescoço torto de tanto tempo que passava ali olhando. De dia só se vê fumaça e à noite uns pontinhos vermelhos, como na foto força-barra abaixo.

Vista da cozinha; inspira, viu?
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EXTRA EXTRA EXTRA!!!

Aos 48 do segundo tempo, quando esse post já estava mais que pronto, rolou a tão sonhada caminhada para ver uma erupção de perto. Era a mesma que estava rolando pela janelinha do sótão. Eu liguei no domingo para o Ermanno perguntando se ele não queria ir na terça-feira, pois era meu dia de folga. Ele ficou de ver. Estava corrigindo as últimas provas de recuperação e em cima da hora disse sim. Encontrei ele na Via Etnea, a Avenida Paulista daqui, passamos na casa deles, pegamos Laura, Jéssica e Luna, a dog.

Foi uma hora e meia até chegarmos no estacionamento para o Vale del Bove, de onde parte um monte de trilhas, inclusive a que pegaríamos. Como até o último momento não sabia se iria, acabei esquecendo minha lanterna em casa. E o problema: Ermanno também.

Prova do crime, eu vi

Não havia lua, só Luna, mas a coitada é mais preta que rocha lávica. Depois de uns minutos os olhos acostumam e o passo fica mais firme e assim fomos, montanha acima, começando de 1900m. Já eram 21h30 quando começamos a subir, e a luz da cidade amenizava bem a falta de lanterna.

Jessica, mamma Laura e papa Ermanno; e Luna, esse breu na perna da Laura

Cruzamos 4 grupos no caminho, cada um dava uma duração diferente da trilha, mas todos diziam que dava para ver super bem a colatta lávica. E de fato, depois de uma hora morro acima, com partes de areia e outras de pedregulho-bom-pra-torcer-tornozelo, avistamos aquele rio incandescente, que escorria lentamente há uns 300m de nós, do outro lado de um penhasco.

Ja pus essa foto aqui, mas não dá, adoro ela

Que coisa mais fantástica a Terra cuspir fogo, brasa! Foi uma caminhada inesquecível, pois foi a primeira vez que vi magma de perto, mesmo estando a 300m. Desperta a mesma emoção que descrevi quando vi uma outra erupção uns dias antes, do outro lado da montanha, ao levar o carro do Ermanno para a revisão.
Mas confesso que ali, na montanha, a lava iluminando o breu, o coração bateu bem mais forte.

PS: post escrito em junho; preciso esvaziar meus posts salvos e mandar ver nos novos. Perspectivas de um tempo sem acesso, então: chuva de posts.