segunda-feira, 28 de abril de 2008

Paris, eternamente agradecido

Dois dias em Paris é pouco. Precisávamos deixar malas, descarregar as quinquilharias mil que vieram do Marrocos. Claro que não sou eu o sacoleiro e todas as minhas aquisições juntas não enchem um saquinho de supermercado. Mas como tamo viajando juntos, fiz esse esforço incrível e dramático de passar duas noites em Paris. Um sofrimento só, menina!

Paris é de muita gente, muito misturada. Aquela cara do francês padronizada, que eu conheço depois de muitas horas dividindo carteiras e salas de aula, já quase não tem mais. Todo mundo tem uma cara meio globalizada, por mais gaulês que aparente ser. Tem sempre um elementos na roupa, no jeito ou no andar que dá uma cara de “mélange” intenso aos parisiens.


Mistura que trai os pré-conceitos

Metrô aqui é uma terapia étnica. Uma vitrine de peles, cabelos e tamanhos diferentes. Mais que isso, é uma amostra de heterogenidade do ser humano. Um nórdico dividindo banco com um cidadão creóle é mistura. “Só misturando pra ver no que vai dar”, diz a música Homem Amarelo, d’ O Rappa. E na Cidade Iluminada o título da canção se enche de sentido e coerência. Há preconceito em Paris, claro que sim, mas há também um certo mea-culpa por ser a gigante que é. Por mais que se falem de políticas para controlar imigração, há um quê de coração de mãe latente no ar. Muito espaço para os turistas, você não vai se sentir um estranho se abrir um mapa no meio da rua.


Junto com essa indiferença positiva, vem também um aspecto óbvio, mas curioso do cidadão: a solidão. Cada um que anda a caminho de casa ou rumo ao trabalho, com seu fone branco plugado no ouvido (ninguém não tem iPod) carrega no rosto uma implícita tatuagem de solidão. A metrópole cosmopolita acelerada e frenética não aparenta ter tempo nem muita paciência para relacionamentos humanos. Não estranhe a frieza de um parisiense. Perto deles, nós paulistanos somos verdadeiras donas de pousada baianas. Quando Zeca Baleiro escreveu “Eu tava triste/ Mais solitário que um paulistano” ele com certeza ainda não tinha analisado o povo daqui.

E como é caro. Não vou ficar aqui fazendo comparações ou o data-big-mac, muito usado pelos guias de viagem. Tudo custa os olhos e uma etiqueta salgada das Galleries Lafayette pode ajudar a explicar a solidão, o frenesi e a beleza de Paris. A impressão é que esse rush todo é para alimentar esse círculo viciante, ganhar dimdim para poder bancar o life-style e continuar vivendo aqui.


Mas não tem essa pegada fashion pagação. A coisa é fluida, tem muito intelecto funcionando aqui, uma coisa bem menos maquinária que Nova York. Tem uma preocupação política (senti muita satisfação com Sarkozy. O cara faz as coisas, principalmente no plano das leis e impostos) e questionamento constante. A casa tá ficando cheia? Tá, mas não tem tanto extremista assim a ponto de querer um governo “expulsor”. A idéia é regulamentar mais e cortar regalias oferecidas pelo Estado. Um outdoor de Ingrid Betancourt junto com um relógio que mostra que seu seqüestro se estende por 2743 dias se impõe na fachada da prefeitura (Hotel de Ville). Isso tem um significado maior. Hoje, nem a menina Isabella consegue ganhar destaque assim.


Beaubourg por fora


Do alto do Beaubourg pra fora.

Aproveitando o engajamento, vamos falar de cultura. O Beaubourg, vulgo Centre Georges Pompidou (todo mundo pronuncia Bubú), é um dos espaços mais fervilhantes de cultura desse lugar. Por dentro e por fora, já que na frente ficam artistas fazendo performances numa espécie de pátio-jardim, onde muitos ficam sentados, conversando ou lendo. Há dezenas de espaços públicos de qualidade, que são compreendidos e aproveitados como tal. O povo senta na grama, toma sol, anda na praça, empurra o filho no playground, leva o cachorro para andar sem coleira à noite. Ah, o Pompidou também bomba por ter vários espaços agradáveis com wi-fi grátis.



Louise Bourgeois fazia as honras da casa dessa vez, mas não deu pra ver muito. Já era tarde. Vimos as permanentes, mas foi um pedaço de colcha bordado por Louise que provocou mais, nele estava escrito com letras arredondadas: “I’ve been tô hell and back. And let me tell you: it was wonderful”


Enfim, para celebrar a rápida estada um passeio em Chatelet à noite, sob a lua cheia, que vimos crescer no Sahara e agora nos sorri na noite parisiense. Merci, infiniment merci.

2 comentários:

andrelucas1303 disse...

Sensacional
parabens

o blog é muito bom.

me perdi horrores por aqui. A melhor passagem foi "o mais louco é que depois de camelar por quase 3 anos na Lew’Lara, lá estava eu camelando no Saara."

Pois é, nesse momento, quase meia noite de uma quarta pré-feriado estou camelando na McCann. Eis que caio no seu blog por indicação da Paula Gabriel e passo um tempão lendo suas experiências. Muito boas! E seu texto tb. Parabéns


Obrigado pelo momento tão sensacional...

Abraço e boa viagem!

=)

Batistic disse...

querido, é sempre muito bom ler seu blog e poder compartilhar destes momentos. beijos saudosos e carinhosos, bilu